A demora foi secular! Ouvir a televisão que se misturava aos meus pensamentos, e as conversas de dentro da sala em que eu estava à porta foi bem melhor do que eu esperei. Não ouvi mais do que sussurros, mas foi-me suficiente para despertar a agudeza da curiosidade e imaginação que me movem sempre. Ali estavam reunidas todas as mulheres grávidas do universo, tamanho era o espaço pequeno do consultório e a população presente.
Acho que de grávida ali só não estavam eu, minha mãe e a recepcionista também. Haviam grávidas de todos os tipos e cores. Dos mais variados tamanhos e formas. De magia, encanto e sedução. De olhos cansados, de olheiras e de numerosos pés.
Pés que estavam inchados.
Uma enxurrada de pensamentos me tomou. Encontrei tantas expressões, identifiquei variadas emoções, mas de tudo o que se mostrou naquela segunda-feira num consultório que mais parecia uma feira de grávidas, foi que pude sentir além do que minha limitada visão me permitiria num dia qualquer de férias.
Imaginei-me grávida e absurdamente caí numa hilariante gargalhada, mas que idéia! Passível e de fato impossível de se tornar real apesar da imensa beleza que enxergo nessa potencialidade feminina.
Depois da idéia então concebida, avaliei a produtividade sem medida e lá fiquei a observar aquele tanto de grávidas, muitas das quais assustadas.
Entregue ao desenfreado ritmo em que eu mentalmente já estava, fiquei olhando e escutando o discurso de desejo delas, dentre as quais uma me chamou a atenção. De um mau humor estonteante de quem pretende negar a realidade, ela não se achava grávida e não fosse a projeção já bastante saliente de seu ventre talvez até negasse o fato.
Impressionantemente quando eu já estava imersa completamente nas minhas idéias absurdas, minha mãe foi finalmente chamada para ser atendida, no momento de sua entrada, lembrei que já deveríamos ter saído e nessa interrupção de pensamento meu estômago avisou da fome iminente que tentei camuflar com água e doces.
Mas já era tarde, a fúria da impaciência me alcançou e eu não conseguiria fazer mais nada. Toda a produtividade acabou ali, quando parei e vi que só havia restado eu, a recepcionista e uma última grávida que saiu do consultório remando para então dar a vez a minha mãe.
Aquele dia que tudo tinha para ser tedioso, não foi. Sentada por muito tempo esperei minha mãe e só mesmo o escrever para me fazer esquecer a fome canina que me atacou repentinamente, quando comecei a redigir as impresões que ficaram em mim... ah, foi aí então que percebi o quanto este dia foi fértil e que o consultório tinha sido um laboratório natural de produção psicológica cujas estereotipias femininas graciosamente me permitiram ir além do que quase sempre vou: o de sentir a vida nitidamente num olhar de uma mulher.
Que coisa mais linda. Senti isso quando fui da última vez em minha médica, todas grávidas na espera (menos eu), inclusive uma das recepcionistas. Conversas sobre ansiedade, dúvidas e planos pro futuro. Para algumas o momento mais pleno.
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