Um domingo de sol,
muito sol.
O dia amanheceu
conforme o previsto e o desejado por mim e por mais outras 11 pessoas. Estávamos preparados
para a aventura (I Mutirão de Banho no Abrigo de Cães da Dôra) que nos esperava
no bairro da Muribeca na cidade de Jaboatão do Guararapes. Para quem conhece a
RMR (Região Metropolitana do Recife) sabe que o lugar onde o abrigo tem sede é
de difícil acesso.
Ao chegarmos percebi
que não tinha dimensão do quanto seria atingida por aquela aventura, tudo só
ficou claro quando me deparei com um portão e muitos olhares. Os olhares eram
dos cães que esperavam curiosos, clementes e felizes por algo que nem eu, nem
eles sabiam. Parecia que nós éramos desbravadores, super-heróis e que nossa
ação não seria social, mas realmente animal.
Senti minha humanidade
ali.
Fui duramente afetada por imagens difíceis de descrever e digerir. As
palavras são pequenas para dizer a tristeza que me atingiu, a realidade
literalmente crua que se mostrou a mim e aos outros voluntários. Não havia
opacidade nos animais, tampouco nos olhares dispersos numa ansiedade que era
minha e acho que de todos também.
E entrei com vontade de
não voltar, de não ver, não querer estar ali, aqui, entre nós. A miséria da humanidade
tem nome e se chama individualismo, estávamos na Muribeca comprovando isso.
Um abrigo, dois
terrenos, um casebre aos fundos, algumas construções ainda por acabar, telhas,
cachorros, um ser humano dividido em 11 outros seres e muita, mais muita boa
vontade.
Mas lembro aqui que
infelizmente a boa vontade sozinha não pode mover o mundo repleto de corações
ressecados pelo egoísmo. Portanto Maria Auxiliadora Florêncio, D. Dôra, como é
conhecida, proprietária do abrigo de cães que leva seu nome, precisa de ajuda
para manter em condições dignas a vida dos 116 cachorros que se encontram sob
os seus cuidados¹. Na situação precária de espaço e higiene em que vivem os bichanos,
alguns estão gravemente doentes, pois como boa parte desses animais é trazida
da rua, já chegam ao local contaminado por várias doenças, entre elas a
cinomose que requer cuidados especiais não disponíveis pela ausência de
infra-estrutura, vacinas e medicamentos.
Além disso, há o
problema da leishmaniose que é uma zoonose que merece atenção, pois atinge o
homem também. Havia um número considerado de cachorros bastante doentes, uns
até em estágio terminal e outros que devido à fragilidade poderiam facilmente
ser vítimas do mosquito transmissor, já que um número considerado tinha os
sintomas da doença.
Havia caixas d água
espalhadas pelo ambiente, todas devidamente vedadas, claro. Mas aí fiquei
imaginando como aquela mulher (diga-se de passagem, guerreira) conseguiu manter
o abrigo e todos aqueles animais com tão pouco auxílio.
Bom, antes de dar por
encerrado esse texto gostaria de falar da maravilhosa impressão que me foi deixada
desse dia. Antes de entrarmos éramos estranhos para os cães e uns para com os
outros, (lá só conhecia minha irmã) mas a recepção foi calorosa do princípio ao
fim, até estabanada em alguns momentos, mas o prêmio do dia surgiu antes de
sairmos e foram os olhares de satisfação e os cumprimentos agradecidos daquelas
criaturas tão fiéis a nós míseros humanos.
A isso não há dinheiro no mundo que possa
comprar.
Portanto tenho a
certeza que pelo pouco que ajudamos saímos de lá melhores, não maiores, mas mais
dignos porque fizemos a diferença. Porque ajudar não faz bem apenas a quem
recebe, mas principalmente a quem de fato ajuda, nessas horas os bons
sentimentos se multiplicam e as esperanças de um mundo melhor reaparecem.
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¹Contagem dos animais realizada no dia 10 de julho de 2011
(Os voluntários)
Quem se sensibilizou com essa história verídica e deseja ajudar porque sabe que só se sensibilizar não é suficiente (é preciso agir para tornar o mundo um pouco melhor!) entre em contato para mais informações.
"O que plantamos hoje colheremos amanhã!"